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XIV Reunión del Consejo de Ministros de Relaciones Exteriores de la ALADI
Palavras pronunciadas pelo Ministro das Relações Exteriores da República Federativa do Brasil, Celso Amorim, no Conselho De Ministros em Sua Décima Cuarta reunião
03/11/2008

Senhor Presidente, em primeiro lugar meus cumprimentos a Vossa Excelência também, pelo posto que foi guindado recentemente e que vos traz aqui para a Presidência deste órgão.

Senhor Presidente, antes de fazer algumas considerações sobre a ALADI e as decisões que vamos tomar aqui, hoje, eu gostaria de fazer uma homenagem muito especial ao meu amigo Didier Opertti, que deixará o cargo dentro de poucos dias.

O tempo é um grande teste para as amizades e para a nossa percepção da integridade dos homens e das mulheres, e eu posso dizer que tenho o privilégio de conhecer Didier Opertti, o Secretário-Geral dessa organização, já há alguns anos, e o vi atuando nas mais diversas condições e nos foros mais distintos. Inclusive, tive a honra de colaborar com ele quando exerceu aquele posto que talvez seja o mais alto que pode ser reservado nos órgãos colegiados internacionais, que foi o de Presidente da Assembléia-Geral, e posso dizer, senhor Presidente, que os uruguaios e os latino-americanos podem se orgulhar de ter tido Didier Opertti à frente da Assembléia-Geral das Nações Unidas, quando contribuiu muitíssimo, inclusive para a valorização do papel da própria Assembléia no contexto das decisões que são tomadas na ONU.

Didier Opertti, com certeza, deixa essa organização, mas não deixará os seus esforços pela integração, pela paz e pelo desenvolvimento. Foi um motivo de grande satisfação, de orgulho e de prazer pessoal ter convivido durante tantos anos com Didier Opertti e ter privado familiarmente, eu e minha mulher também, com o casal Opertti. Estou certo que será uma das figuras importantes latino-americanas que serão lembradas ao longo da história quando olharmos para esse nosso continente. Então eu queria, nesse adeus, dizer também que o adeus vem mesclado com a certeza de que Didier Opertti, aonde estiver, continuará trabalhando pela integração, pela paz e pelo desenvolvimento no nosso continente.

A América Latina e o Caribe vivem hoje um período especialmente favorável ao crescimento econômico e à promoção dos objetivos de maior igualdade e justiça social. Temos obtido avanços significativos na melhora dos índices de redução da pobreza.

Nossa região tem resistido com tranqüilidade aos efeitos da turbulência nos mercados financeiros internacionais.



Após um período de virtual estagnação dos fluxos de comércio intra-ALADI, entre 1998 e 2003, a região vive hoje um momento de franca expansão. Completou, em 2007, seu quarto ano consecutivo de forte crescimento. O volume total do comércio intra-regional, que em 2003 não chegava a US$ 50 bilhões, situa-se hoje acima de US$ 100 bilhões. É um crescimento notável.

Para o Brasil, esse crescimento tem um significado muito especial. As relações comerciais do Brasil com os demais países-membros da ALADI têm dado mostras de enorme dinamismo.

Em 2007, mais de 22% das exportações brasileiras foram destinadas aos países da ALADI. Desses mesmos países o Brasil comprou cerca de 17% de suas importações. Nos últimos dois anos apenas, as importações brasileiras provenientes dos países da ALADI praticamente duplicaram: passaram de US$ 11 bilhões em 2005 para mais de US$ 20 bilhões em 2007.

Embora o dado que eu vá mencionar em seguida extrapole os limites estritos da ALADI, creio ser significativo assinalar, neste foro, que o conjunto da América Latina e Caribe é hoje o maior cliente para as exportações brasileiras, à frente da União Européia e dos Estados Unidos. A América do Sul, sozinha, é hoje um mercado maior do que os Estados Unidos ou mesmo do que o conjunto dos países asiáticos, em que pese ao grandíssimo crescimento da China.

O Brasil hoje tem superávit em sua balança comercial com a grande maioria dos países da região. Notamos, porém, com satisfação, que as compras brasileiras têm crescido mais rapidamente que as nossas vendas. Esperamos que essa saudável tendência ao equilíbrio se mantenha e, mesmo, se reforce. Temos procurado contribuir para isso de várias maneiras, inclusive por meio de programas que visam a estimular as nossas compras dos nossos vizinhos, especialmente aqueles de economia mais frágil.

O marco jurídico da ALADI é fundamental para que nossos países possam dar continuidade a essa promissora expansão do comércio intra-regional e aprofundar a integração.

Em 2004, consagramos o objetivo de construção de um Espaço de Livre Comércio. Desde então, demos passos importantes nessa direção.

Em 2005, entraram em vigor os ACEs 58 e 59, que aprofundaram os vínculos econômicos entre o Mercosul e os países andinos.

Estabelecemos as bases para concretizar, até 2019, uma verdadeira zona de livre comércio da América do Sul. E não posso deixar de recordar, senhor Presidente, talvez pela idade, superado talvez apenas pelo nosso Secretário-Geral, que em 1994, nesse mesmo foro, secundando uma proposta que o então presidente Itamar Franco tinha feito no Grupo do Rio, eu propunha uma área de livre comércio sul-americano. Naquela ocasião, a proposta havia sido recebida com certa frieza, vamos dizer assim. Mas eu também não posso me esquecer que, em 2004, quando aqui voltamos para firmar os acordos entre o Mercosul e a Comunidade Andina, a então Chanceler da Colômbia, minha querida amiga Carolina Barco, dizia que, com aqueles acordos, na prática, estávamos criando uma área de livre comércio sul-americana, - os que estavam aqui, entre eles o nosso Secretário-Geral, se recordarão desta passagem.

Muito cresceu também e tem crescido nosso comércio com o México, do Mercosul com o México, e queremos aprofundar esses acordos, como desejamos aprofundar também as nossas relações comerciais com Cuba. Muito se faz no âmbito bilateral, mas evidentemente que um adequado marco multilateral favorece a essas trocas, favorece a essa integração.

Nosso objetivo é aprofundar as preferências regionais no seu conjunto e em cada uma das sessenta e seis relações bilaterais cobertas no âmbito da ALADI. Daí talvez a importância de trabalharmos mais por esse espaço econômico, isso inclusive simplificará para os nossos empresários o conjunto de acordos que eles hoje têm que olhar, são sessenta e seis relações bilaterais, segundo o cômputo dos nossos especialistas que mantemos aqui. Por isso, o Brasil propôs, na preparação desse encontro, que a ALADI adote, como meta mobilizadora, o objetivo de alcançar a liberalização de substancialmente todo o comércio, para usar o jargão da OMC e do antigo GATT, até 2019.

No plano das relações bilaterais, como temos dito, somos também favoráveis ao aprofundamento das relações com o México e com Cuba, além, naturalmente, dos outros países andinos a que já me referi.

As relações comerciais intra-ALADI comportam, como sabemos, uma pluralidade de situações, envolvem, portanto, diferentes ritmos e condicionantes. Devemos abordá-las com consciência desse fato, mas ao mesmo tempo com o grau de ambição que corresponda às realidades do mundo de hoje, sem desconhecer naturalmente as particularidades e assimetrias.

O próprio Secretário-Geral já mencionou vários dos avanços que é necessário fazer em relação a regras comerciais. Eu queria apenas fazer uma outra breve digressão, porque quando colocamos tanta ênfase no livre comércio e é interessante que -voltarei a esse tema no final- é interessante que a ALALC tenha deixado de se chamar ALALC e tenha passado a se chamar Associação Latino-Americana de Integração, porque quando colocamos essa ênfase no livre comércio, não é o comércio pelo comércio, é sobretudo o comércio também como criador das condições para que existam entre nós, verdadeiramente, desenvolvimento e paz.

Eu não vou entrar em assuntos que estão ainda tendo a sua fase de cicatrização, mas todos assistiram -e certamente assistiram com agrado- à conclusão da reunião do Grupo do Rio, e nós sabemos que quanto mais trabalharmos pela integração, pela interdependência entre os nossos países, mais possibilidades temos de consolidar a nossa região como uma região de paz. É o que a distingue de qualquer outra região do mundo, de modo muito especial. E a missão da ALADI, senhor Secretário-Geral, senhor Presidente, se me permitem, é sobretudo isso, trabalhar pelo comércio, trabalhar pela integração, porque dessa maneira estamos trabalhando sobretudo pela paz.

Estamos finalmente passando do plano conceitual da Resolução 59 para o terreno de sua concretização prática.

Estamos também estabelecendo as diretrizes necessárias para levar adiante um processo negociador na área de serviços, que é um dos elementos mais dinâmicos nas relações econômicas entre nossos países. É um paradoxo que alguns dos nossos países tenham demonstrado maior grau de abertura à negociação na área de serviços com países ricos do que com os próprios vizinhos. E o que eu faço não é crítica a ninguém, é também uma autocrítica, de modo que acho que todos em conjunto temos que olhar para esse fato e estudar o que está nos impedindo de avançar mais.

Creio que também será possível, mais adiante, explorar a possibilidade de movimentos semelhantes na área de investimento, em razão da crescente importância dos fluxos de capital e de investimentos privados no processo de integração regional.

As resoluções que devemos aprovar hoje não excluem nenhum desses temas do amplo processo negociador que desejamos colocar em marcha.

Um tema especialmente caro ao Brasil é o apoio aos países de menor desenvolvimento relativo. Temos intensificado ações no âmbito do nosso Programa de Substituição Competitiva de Importações. E eu diria que o fato de que as importações brasileiras têm hoje aumentado mais rapidamente que as exportações não é totalmente estranho a esse esforço deliberado do Governo para equilibrar algo mais as relações com nossos vizinhos, e sobretudo com aqueles mais pobres. O Brasil tomou a decisão de acelerar a abertura de seu mercado para os produtos exportados pela Bolívia e pelo Equador, concedendo, de imediato, 100% de preferência. Esperamos que o processo de protocolização dessa medida, no âmbito do ACE 36 e do ACE 59, se conclua no mais breve prazo possível, dentro desse mesmo espírito de poder contribuir para a paz e para o desenvolvimento dessa região. Apesar de ser um gesto importante, reconhecemos que mesmo a concessão de 100% de preferências tarifárias pode não ser suficiente para promover volumes maiores de exportação dos países mais pobres. Daí a importância de assegurar formas de tratamento diferenciado, na definição dos regimes de origem, e de promover mecanismos de cooperação sobre normas técnicas, medidas de natureza sanitária, e como eu já disse antes também, promover investimentos que facilitem a exportação desses países mais pobres para os países relativamente mais desenvolvidos. Todos somos pobres na região, mas uns são mais necessitados do que outros.

Senhor Presidente,

Todos aqui conhecem o empenho que o Brasil, especialmente o governo do Presidente Lula, tem posto na integração da América do Sul. Achamos que uma América do Sul forte e unida é essencial para a integração de todos os países da América Latina e Caribe. Quero insistir neste ponto, não há contradição entre integração da América do Sul e a integração da América Latina e o Caribe, pelo contrário, ela ajuda, da mesma maneira que a integração dos países centros-americanos também contribui para isso. É isso que desejamos.

Por isso mesmo, temos iniciado sondagens com vistas à convocação, possivelmente durante a Presidência brasileira do Mercosul, de uma ampla conferência que reúna os membros de todos os processos de integração latino-americano e caribenhos. Isso vai na direção da convergência de que falava Vossa Excelência, mas uma convergência talvez ainda mais ampla que inclua todos os processos de integração da América Latina e do Caribe. Só assim reforçaremos nossa região.

Senhor Presidente,

A América Latina -e sempre que falo na América Latina, incluo o Caribe- viveu historicamente entre concepções extremadas sobre o papel do comércio no desenvolvimento. Como reação aos padrões coloniais, investimos pesadamente no modelo de substituição de importações. Quando esse modelo deu sinais de esgotamento, fomos buscar o remédio no receituário neoliberal. O livre comércio passou a ser visto como uma panacéia e a liberalização, muitas vezes unilateral, nos custou importantes perdas de competitividade. Mas o livre comércio também contribuiu para a integração. Hoje, quando compreensivelmente se ouvem reações aos excessos do liberalismo econômico, corremos o risco de, como dizem os anglo-saxões, jogar fora o bebê com a água da banheira. O que importa, mais do que tudo, é fazer do livre comércio entre países em desenvolvimento, isto é, países que têm graus de desenvolvimento semelhantes, como são os nossos, um instrumento do desenvolvimento - e não um fim em si mesmo. Como concebemos, o livre comércio, na nossa região, não é, não deve ser, incompatível com políticas industriais ativas, com políticas agrícolas ativas ou com o reconhecimento de assimetrias. Não é o ganho pelo ganho, mas a utilização criativa e solidária das vantagens comparativas em benefícios de todos os nossos povos.

É assim que concebemos o Espaço de Livre Comércio que começa a tomar forma.

Muito obrigado.