Artigos de Opinião

   MORFOLOGIA DO PROCESSO DE INTEGRAÇÃO DO CARIBE. Primeira parte.

Introdução

“Quem diz união econômica, diz união política. O povo que compra, manda. O povo que vende serve. Há que equilibrar o comércio para garantir a liberdade. O povo que quer morrer vende para um povo só; o povo que quer salvar-se vende para mais de um. O influxo excessivo de um país no comércio de outro vira influxo político […] O povo que quer ser livre, que seja livre em negócios. Distribua seus negócios entre países igualmente fortes.”

José Martí
Conferência Monetária das Américas, 1891

O escopo deste artigo especial, dividido em duas partes que serão publicadas nesta e na próxima edição do Boletim Informativo da ALADI, é oferecer um balanço do surgimento e da integração dos estados insulares do Caribe como membros da Comunidade do Caribe, conhecida pela sua sigla CARICOM. Há mais de três décadas, a comunidade vem trabalhando pela união dos países do Caribe insular, embora inclua dois países do continente: Guiana e Suriname. O artigo explica, também, o processo de integração até chegar à CARICOM e à estrutura desta Comunidade.

A CARICOM pode ser considerada como o processo de integração mais avançado da nossa região, que deu seus primeiros passos em 1958 mediante vários mecanismos e organizações criados com vistas a garantir seu funcionamento, como o Mercado e Economia Única (CSME) e a Corte Caribenha de Justiça, apesar de esses processos não terem ainda finalizado.

O conhecimento desta sub-região pode constituir um passo para a aproximação ao Caribe e para a possível integração da CARICOM com a ALADI. O Caribe constituiu um fator importante na liberação da América Latina, quando, em duas ocasiões, em 1815 e em 1816, a pequena República de Haiti, sob governo de Alexandre Pétion, prestou ajuda imediata a Bolívar para que continuasse com sua luta pela pátria grande.

O Caribe é uma região única pela sua diversidade, complexidade e unidade. Nele, coexistem nacionais de origem ameríndia, europeia (inglesa, francesa, holandesa e espanhola), africana, indiana, meso-oriental e asiática, com alto grau de mestiçagem (negros, mulatos, caboclo, crioulos brancos), com suas línguas (castelhano, inglês, francês, holandês) e dialetos (créole, papiamento e saranan tongo)

A integração na América Latina tem ocupado um espaço importante na dinâmica política e econômica da região. Para os estados insulares caribenhos – como eles assinalam em cada fórum econômico mundial – faz-se necessário o tratamento especial e diferenciado, devido a suas economias e populações serem pequenas.

Cabe salientar que, na América Latina, a CARICOM têm assinado acordos comerciais de alcance parcial com a República Bolivariana da Venezuela (1998) e com a Colômbia (1994), além de um acordo de livre comércio com a Costa Rica (2004). Embora os membros da CARICOM tenham aproveitado só as oportunidades de acesso aos mercados em virtude destes acordos, os países da América Latina representam 13,3% das exportações da CARICOM (CEPAL; 2014d: 137).

A integração, mais do que uma aspiração, é hoje uma necessidade se desejarmos atingir níveis de desenvolvimento econômico, político e social que acompanhem a situação dos países mais desenvolvidos. Para tanto, é necessário estreitar as relações e aprofundar o conhecimento recíproco entre os estados latino-americanos e os pequenos estados insulares do Caribe. Eliminar essa brecha de desconhecimento mútuo é imperativo.

1. Antecedentes da CARICOM

O antecedente mais próximo da Comunidade do Caribe foi a instauração, em 1958, da Federação das Índias Britânicas, que concluiu em 1962. O fato deve ser considerado, em muitos sentidos, o verdadeiro início da atual CARICOM.Esse início marcou um dos esforços mais denodados dos líderes caribenhos por fortalecer laços entre as ilhas e por conservar as diversas áreas de cooperação que existiam na Federação. Esse contexto foi marcado pela independência da Jamaica e de Trindade e Tobago, quando conseguiram controlar, a partir desse momento, seus próprios assuntos nacionais e externos.

Com o anúncio de sua saída da Federação, o governo de Trindade e Tobago propôs a criação da Comunidade do Caribe, com a inclusão não só dos dez membros da Federação, mas também das três Guianas: a inglesa, a francesa e a holandesa, e de todas as ilhas do Mar Caribe, independentes ou não. A independência dos membros do que, posteriormente, seria a CARICOM foi sendo atingida paulatinamente, a partir da década de 1960 e até a década de 1980. Pelo tempo que levou, o processo pode ser considerado como uma barreira inicial ao processo de integração almejado nas primeiras reuniões.

Para discutir o conceito, o primeiro ministro de Trindade e Tobago convocou, para julho de 1963, a Primeira Conferência de Chefes de Governo, à qual compareceram os líderes de Barbados, Guiana Britânica, Jamaica e Trindade e Tobago, que discutiram, de forma clara, sobre a necessidade de uma estreita cooperação com a Europa, a África e a América Latina.

A partir disso, foram realizados vários encontros de alto nível. Em julho de 1965, as discussões entre os primeiros ministros de Barbados, Guiana Britânica (doravante, Guiana) e o ministro negociador de Antígua e Barbudas decorreram na proposta de uma possível área de livre comércio no Caribe.

Em dezembro desse ano, acordou-se constituir a Associação de Livre Comércio Caribenho (CARIFTA) mediante o Acordo de Dickenson Bay, (Antígua e Barbudas) e incluir tantos países da Mancomunidade quanto possível. Acordou-se, ainda, que a Associação de Livre Comércio fosse o início do que seria o Mercado Comum Caribenho, que poderia ser estabelecido graças às consecuções de uma Comunidade Econômica de Territórios Caribenhos viável.

Um novo acordo constitutivo da CARIFTA entrou em vigor em 1.o de maio de 1968 entre Antígua e Barbudas, Barbados, Trindade e Tobago e Guiana. No mês de julho, somaram-se Dominica, Granada, São Cristóvão e Neves e Anguila, Santa Lúcia e São Vicente e Granadinas e, no mês de agosto, Jamaica e Montserrat. Finalmente, Belize passou a integrar a Associação em maio de 1971.

Em 1967, a Conferência de Chefes de Governo estabeleceu a criação da Secretaria Regional da Comunidade Caribenha, instaurada em 1.o maio de 1968 em Georgetown (Guiana), e do Banco de Desenvolvimento Caribenho (CDB), aberto em outubro de 1969 em Bridgetown (Barbados).

Em outubro de 1972, na Sétima Conferência de Chefes de Governo, os líderes caribenhos decidiram transformar a CARIFTA em um mercado comum e estabelecer a Comunidade do Caribe, da qual o mercado comum poderia ser parte integral.

A Oitava Conferência da CARIFTA, celebrada em abril de 1973, em Georgetown (Guiana), materializou a decisão de estabelecer a Comunidade do Caribe, com a assinatura de onze membros da CARIFTA (todos menos Antígua e Montserrat).

O acordo deu lugar à firma do Tratado da Comunidade de Caribe, em 4 de julho de 1973, que entrou em vigor em agosto desse mesmo ano para os quatro países independentes: Barbados, Guiana, Jamaica e Trindade e Tobago. Também, estabeleceu que os oito territórios restantes que assinaram o acordo – Antígua, Honduras Britânica (atualmente, Belize), Dominica, Granada, Santa Lúcia, Montserrat, São Cristovão e Neves e Anguila e São Vicente e Granadinas – se constituíssem como membros plenos a partir de 1.o de maio de 1974.

A Comunidade Caribenha e Mercado Comum (CARICOM) foi fundada pelo Tratado Chaguaramas. Em 4 de julho de 1983, as Bahamas passaram a ser o 13.o estado-membro, mas não membro do Mercado Comum. Suriname foi incorporado em 4 de julho de 1995 e, finalmente, Haiti passou a ser o 15.o estado-membro, em 3 de julho de 2002.

Em julho de 1991, as Ilhas Virgens Britânicas e as Ilhas Turcas e Caicos passaram a ser estados-membros associados, seguidos por Anguila, em julho de 1999. Em 16 de maio de 2002, foi a vez das Ilhas Cayman e, em 2 de julho de 2003, as Bermudas incorporaram-se como o quinto membro-associado.

Vários estados latino-americanos são observadores em órgãos e instituições da Comunidade, bem como Porto Rico, que procura estreitar vínculos com a CARICOM.

Organização de Estados Caribenhos Orientais (OECO)

Em 18 de junho de 1981, foi criada, dentro da CARICOM, a Organização dos Estados Caribenhos Orientais (OECO), integrada pelos sete estados do Caribe oriental (Antígua e Barbuda, Dominica, Granada, Montserrat, São Cristóvão e Neves, Santa Lúcia e São Vicente e Granadinas) mediante a assinatura do Tratado de Basseterre, com o intuito de atingir maior consistência política, capacidade de negociação com o exterior e aumento da cooperação na CARICOM. Na Comunidade, contemplam-se países de menor desenvolvimento, que recebem tratamento especial e diferenciado dos países de maior desenvolvimento deste mecanismo regional. A OECO conseguiu estabelecer uma moeda única entre os seus integrantes.

2. Estrutura e objetivos da CARICOM

Atualmente, a CARICOM é integrada por quinze países e sua Secretaria-Geral tem sede em Georgetown (Guiana).

Países-membros da Comunidade: Antígua e Barbuda, Bahamas, Barbados, Belize, Dominica, Granada, Guiana, Haiti, Jamaica, Montserrat, São Cristóvão e Neves, Santa Lúcia, São Vicente e Granadinas, Suriname e Trindade e Tobago. Haiti foi a mais recente incorporação da CARICOM, em 4 de julho de 1997, durante a XVIII Conferência de Chefes de Governo (Montego Bay, Jamaica). Sua incorporação ao mercado comum será em etapas. Haiti é o segundo país não anglófono admitido como membro pleno da CARICOM. O primeiro, Suriname, ingressou em julho de 1995.

Países observadores: Aruba; Antilhas Holandesas; Colômbia; República Dominicana; Porto Rico, México e Venezuela.

Países associados: Anguila, Ilhas Bermudas, Islas Cayman, Ilhas Virgens Britânicas e Ilhas Turcas e Caicos. Este status não tem apenas significação prática.

A CARICOM conta com uma estrutura institucional composta de:

  • Conferência de Chefes de Governo (órgão supremo)
  • Conselho do Mercado Comum
  • Comitês de Políticas Setoriais
  • Secretaria-Geral (órgão Técnico)
  • Instituições Associadas
  • Banco de Desenvolvimento do Caribe
  • Conselho de Exames
  • Conselho Meteorológico
  • Conselho de Educação Local
  • Universidade das Índias Orientais
  • Organização dos Estados do Caribe Oriental

Outros fóruns:

  • Conselho para o Desenvolvimento do Comércio e da Economia (COTED)
  • Conselho para o Desenvolvimento Humano e Social (COHSOD)
  • Conselho para as Relações Comunitárias Externas (COFCOR)
  • Conselho de Finanças e Planejamento (COFAP)

Conferência de Chefes de Governo:

É o órgão supremo da Comunidade. Celebra anualmente um período de sessões ordinárias, geralmente, nos primeiros dias do mês de julho, e outro, normalmente, em fevereiro de cada ano. A Conferência pode delegar funções ao Bureau, integrado também por mandatários.

Conselho de Ministros da Comunidade:

É o segundo órgão mais importante e tem por função principal o planejamento e a coordenação estratégica da CARICOM nas esferas de sua competência. Funciona, também, como instância preparatória da Conferência.Para o desempenho de suas funções, estes órgãos principais contam com o apoio dos seguintes fóruns:

  • Conselho de Comércio e Desenvolvimento Econômico (COTED):

É encarregado de promover o comércio e o desenvolvimento econômico da Comunidade. Dentre outras responsabilidades, supervisa o funcionamento do mercado e a economia únicos da Comunidade.

  • Conselho das Relações Exteriores e da Comunidade (COFCOR):

Sua responsabilidade é definir as relações entre a CARICOM e outros países ou organizações internacionais. Coordena as políticas exteriores dos seus estados-membros e, quando cabe, adota posições conjuntas na Comunidade sobre assuntos hemisféricos e internacionais importantes.

  • Conselho de Desenvolvimento Humano e Social (COHSOD):

Deve impulsionar o desenvolvimento social e humano, em particular, mediante o desenvolvimento da saúde, da educação e do esporte.

  • Conselho de Finanças e Planejamento (COFAP):

É encarregado, fundamentalmente, da coordenação da política econômica e da integração financeira e monetária dos estados-membros. Sob direção do COFAP, o Comitê de Governadores de Bancos Centrais oferece ajuda no desempenho desta responsabilidade.São órgãos subsidiários da CARICOM o Comitê de Assuntos Jurídicos, o Comitê de Orçamento e o Comitê de Governadores dos Bancos Centrais, que desempenham funções de assessoramento.

Ofelia Arteaga
Conselheira Econômica e Comercial
Representante Alterna de Cuba junto à ALADI


Nota: As opiniões contidas no presente artigo são de responsabilidade exclusiva de sua autora.

Volver