Artigos de Opinião

   A integração em transição

Há tempo vem se falando que a região está em crise, que a atitude da Argentina e do Brasil nas relações com seus vizinhos e que os eventuais resultados de seus avatares eletorais levarão ao fracasso da integração sul-americana. Afinal, por tudo isto o MERCOSUL fracassou sem atingir seus objetivos.

Tais afirmações baseiam-se em argumentos como a desintegração de esforços mediante a criação de fóruns que se superpõem em matérias, objetivos, integrantes, etc.; na ausência de definição estratégica comercial, econômica e política comum e na inexistência de um ator determinante com suficiente representatividade latino-americana.

A maioria esquece que a integração regional implica processos com características diferentes e em que participam Estados de forma e em âmbitos também diferentes. Ninguém menciona a importância da vigência que o Tratado Constitutivo da ALADI vem mantendo nestes 34 anos. Mais do que isso, ninguém menciona a atualidade do tratado em matéria comercial internacional.

Os detratores do MERCOSUL estão certos num ponto: a integração comercial sub-regional não está funcionando como se esperava. Porém, erroneamente não advertem que o verdadeiro motor do MERCOSUL histórico, real e atual não é o documentado no ACE N° 18, mas o registrado no ACE N° 14, norma que deu origem à abertura de negociações e à posterior incorporação das irmãs repúblicas do Paraguai e do Uruguai.

Não podemos esquecer que a integração bilateral da Argentina e do Brasil representa talvez o marco de maior transcendência dos últimos 30 ou 40 anos na região. O cruzamento de convites entre Alfonsín e Sarney não foi somente protocolar. Os mandatários levaram à prática a máxima da “boa vizinhança” determinando uma relação recíproca de complementação, apesar da flutuação deste fator entre o otimismo e o pessimismo segundo as vicissitudes internas do momento.

Apesar de o MERCOSUL não estar vivendo seu melhor momento não significa que tenha per se fracassado, ainda mais considerando que, conforme os artigos 1 e 3 do TM80 (ALADI) os processos de integração sub-regional são habilitados desde que procurem a convergência na integração regional latino-americana.

Desta forma, perante a realidade do MERCOSUL e da CAN somada à assinatura de acordos de associação entre os Estados andinos e o MERCOSUL, não é desatinado pensar que estamos atravessando uma etapa de transição rumo à convergência. Este fato implicaria que a ALADI assumisse, de forma gradativa, o controle das relações regionais para o qual foi criada.

Portanto, podemos afirmar que nem o MERCOSUL nem a CAN fracassaram. Ambos os organismos são plataformas diferentes para aproximar seus Estados à consecução dos objetivos da ALADI.

Contudo, não apenas continuarão as tarefas em temas comerciais sub-regionais, mas também as questões em matéria de cooperação, estratégias econômicas, políticas, sociais e culturais. Para tudo isto, não há espaço mais adequado que o desenhado por Fernando Henrique Cardoso: a UNASUL. A verdadeira integração dos processos sub-regionais deveria plasmar-se na ALADI no campo comercial e na UNASUL no campo política. O círculo ficaria, então, fechado.

O mundo está mudando. Embora não percebamos, muda constantemente. Tal movimento nos obriga a modificar a nossa conduta a toda hora. Hoje em dia, a América do Sul precisa pensar como enfrentar a globalização do mundo e definir sua posição no planeta e sua integração a ele. Para tanto, é necessário que seja capaz de gerar mecanismos próprios que reflitam suas particularidades, seu marcado presidencialismo, suas origens carentes de fatores emotivos, como as guerras europeias, etc.

Em conclusão, não podemos prever o que irá acontecer nem como, mas é hora de refletir e de pensar o futuro da integração latino-americana assumindo a realidade e permitindo dotá-la de mecanismos flexíveis que, sem esquecer sua idiossincrasia, permitam avançar rumo ao desenvolvimento econômico, político e social da região, garantindo aos seus povos uma melhor qualidade de vida.

Por Santiago Deluca

Professor e advogado do escritório jurídico Gottifredi-Abogados.

Nota: As opiniões expressadas no presente artigo são de responsabilidade exclusiva de seu autor. Artigo publicado na edição de 4 de novembro de 2014 do jornal argentino La Nación.

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